Sobre o amor e sobre a Igreja

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Florianópolis, <2023-07-11 ter>.

Meu amabilíssimo pai,

Te escrevo pela ocasião do seu aniversário de 63 anos. Falamos bastante em nossa última ligação, e pensei em continuar o assunto por esta carta. Quero te falar sobre o caminho que eu encontrei. Não que eu tenha chegado lá, mas quero te falar sobre a trajetória, o mapa, a trilha que encontrei. Ainda que você não reconheça a Igreja de onde tirei esse caminho, talvez reconheça que o caminho é bom, e quem sabe isso possa abrir um caminho de reconciliação, pois a árvore boa dá frutos bons.

A Promessa

Aonde leva o caminho? O caminho nos leva à felicidade plena e duradoura. O paraíso. O encontro com o Cristo após a morte, e pela eternidade. Deus é o princípio e o fim de nossas vidas. A causa e o objetivo. Ele nos cria, no sustenta no ser a cada instante, e o caminho nos leva a Ele.

O antigo Testamento nos fale de uma Aliança feita entre Deus e Abrãao. Falava-se de um reino prometido, e o Reino de Deus não é deste mundo mas do outro. A nova Aliança, anunciada por Jesus, se estende a todos. Os termos da Aliança: que creiamos em Jesus. E quem nele crê, o ama, e quem o ama guarda seus mandamentos.

E qual o seu mandamento?

E o meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, assim como Eu vos amei - João 15:12

E lembre-se, o Cristo se entregou para a Cruz por nós. Então estamos falando aqui de um amor extraordinário.

Sobre o amor

O amor não é um sentimento. O amor pode até ser acompanhado por um sentimento, mas não é um sentimento. O amor é uma expressão do nosso livre arbítrio. É uma escolha que fazemos. É algo que nos determinamos a fazer e cumprimos. Escolhe-se amar, e então dedica-se a amar.

E no que implica amar? Já li bastante sobre isso, mas o pouco que consigo lembrar é o seguinte:

  • quem ama deseja o melhor para a coisa amada
  • quem ama serve à coisa amada com alegria
  • quem ama deseja unir-se à coisa amada

E claro, o nível adequado de amor deve ser proporcional à coisa amada. Sendo Deus o sumo ser, a ele é devido todo o nosso amor.

Me parece que você pode ver o amor como uma arte marcial, onde há variados graus de maestria. De fato, não fazer mal a ninguém me parece uma forma de amor, mas um amor faixa azul, e é possível (e necessário!) que busquemos nos graduar mais. De exame em exame, de faixa em faixa, de amor em amor.

E nossa natureza é tal que somente amamos aquilo que conhecemos. Conhecer a Deus, para querermos amá-lo, para nos pormos a servir e comprovar o nosso amor - eis o caminho. Como conhecê-lo? Tratarei mais tarde.

O Caminho

Me parece que o caminho pode ser resumido em dois princípios:

  • Tornar-se mestre de si mesmo, para então poder doar-se a Deus
  • Conhecer Deus para poder melhor amá-lo e servi-lo

Livrar-se dos vícios

O primeiro ponto é muitíssimo necessário. Ainda que por graça divina sejamos dados conhecer Deus, ainda assim somos humanos e pecamos. E o pecado é muitas vezes consequência de hábito adquirido.

Veja: eu acho que em algum ponto eu recebi a graça de crer. Eu recebi a graça de crer nos ensinamentos sobre o pecado, sobre o julgamento, sobre inferno, e tudo o mais. Eu senti medo de ir para o inferno. E eu cri que o Cristo anunciou no sermão da montanha que até os maus pensamentos são pecados. E ainda assim, por vício e hábito adquirido, não conseguia parar de desejar mulheres alheias.

E me parece que esse é o caso comum: para quem se tornou escravo do vício, conhecer a Lei não é suficiente para cumpri-la. A situação é similar à de um viciado em crack. Ele pode até saber que o vício piora sua vida, mas a tentação do corpo é frequentemente muito forte. Pois bem: é preciso primeiro se livrar do vício. E é difícil, mas, com a ajuda da graça, é possível.

O combate inicial trata-se de dominar as paixões e os vícios. Muito pode ser dito sobre esse combate, mas para uma introdução basta.

Conhecer Deus

Não só Deus existe, como ele se revela para nós. Se revelou a muitos no passado, que escreveram sobre ele, e se revela àquele que o busca.

Quanto ao que foi escrito, a dificuldade é que muito foi escrito, e por muita gente diferente. Nesse ponto o único bom critério que me parece é que não há contradição nas coisas de Deus. A revelação apropriada deve ser a completamente consistente. E qualquer aparente contradição precisa ser explicada. Minha sugestão: ler os 4 Evangelhos, assim como as explicações dadas a ele pelos grandes santos.

Se não quiser o ensinamento dos Santos e da Igreja, podes ler os 4 Evangelhos, mas isso seria em algum sentido análogo a você tentar se ensinar ami-jitsu apenas assistindo à gravações. Até dá para fazer, mas um bom mestre vai te ajudar muito!

De qualquer forma, a meditação sobre a bíblia é forma recomendada para se conhecer Deus. Ler (e meditar!) os 4 Evangelhos até não aguentar mais, então meditar as cartas (o resto do novo testamento), e por fim o antigo testamento.

Quanto à revelação pessoal, esta me parece muito superior à revelação que foi escrita por outros. É preciso que ore, e ore muito! E busque falar com Deus. Em algum momento ele começa a responder. Em algum momento pode ser que você tenha dúvida se a resposta vem de Deus ou de si mesmo. Nesse caso, novamente é bom buscar conselhos espirituais de um mestre.

Se por acaso Deus não responder, me parece que pode ser que um coração puro seja necessário para escutar a resposta. Nesse caso, referir à sessão anterior, ou então a seguinte.

Os Sacramentos

A Igreja ministra sacramentos. Eles são sete ao todos: batismo, penitência, Eucaristia, …. Você pode ver cada um deles como uma dose de graça. Um comprimido, uma injeção, um suplemento de graça. E aos poucos o espírito vai se fortalecendo e se purificando. Essa graça ajuda tanto no combate aos vícios, como no conhecimento de Deus.

Quero notar também que essa purificação é sutil, e o efeito é cumulativo. Não espere um efeito dramático e radical. É algo que vem com o tempo. Ao menos na maioria dos casos.

Por fim vou relatar uma experiência pessoal. Argumentar ajuda, mas também ajudam os sinais e testemunhos.

Depois de ler os relatos do peregrino russo, eu fiz a minha próxima confissão em um novo nível de sinceridade. Pedi perdão a Deus, dentre outras coisas, por me pegar planejando como eu poderia influenciar o curso das coisas neste país. Ousei confessar qualquer coisa que me ocorria ser uma falta de confiança em Deus. Pois quando o sacerdote pronuncio a benção, eu senti um sopro no coração. Literalmente, como se alguém soprasse como se assopra uma vela, só que no meu coração.

Por fim, noto que até me parece ser possível achar um caminho sem os sacramentos, mas será muito mais difícil.

Resumo

  • Combater os vícios e pecados
  • Meditar as sagradas escrituras
  • Desenvolver uma vida contemplativa e de oração - uma vida espiritual
  • Utilizar-se dos sacramentos para auxílio em todas as etapas anteriores
  • Um vez dono de si mesmo, e conhecendo a Deus, dedicar todo o seu espírito a amar e servir Deus.

Encerramento

Por hoje é isso. Há muito o que ser dito, mas, me parece, muito pouco o que precisa ser de fato aprendido. Viver uma vida contemplativa e de serviço a Deus - eis o caminho. Quem for humilde e sincero consigo mesmo, e pedir a Deus, descobrirá todo o que for necessário. Todo o resto serve para nos convencer deste caminho, ou revigorar nossa convicção.

Um abraço!

Peço à Virgem Maria, e aos nossos antepassados que estão no Céu, que roguem por nossa família. Para que você possa perdoar os erros da igreja. Que Deus lhe envie outros que expliquem melhor todas estas coisas. E ainda que não perdoe a igreja, que ache um outro caminho para implementar o mandamento do amor.

Amém.

Author: Juarez

Created: 2023-12-14 qui 10:16

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